Nota pessoal: Minha amiga e Flow Barbara Cunha (Celtic Botan) me mandou esse texto incrível pelo msn e eu não podia ser tão mal a ponto de privar outros fãs de le-lo. É um texto lindíssimo sobre uma música que significa demais para a Florence, Only If For a Night. A própria Florence já explicou a música, dizendo que foi inspirada por um sonho ou uma visão que ela teve da avó dela, falecida há algum tempo.
Ademais quero que todos se sintam livres pra fazer o mesmo, enviar qualquer coisa relacionada a Florence que tenha sido feita por vc ou que vc viu e achou belo. Aqui não é só um fan blog com news e updates, mas sim um recanto para compartilhamos nosso amor pela deusa e sua máquina.
Nota da autora: "Quando ouvi "Only If For a Night" pela primeira vez, gostei bastante, mas não me senti realmente ligada à ela assim como me senti com "What The Water Gave Me" ou "Spectrum". Então, soube do quê se tratava realmente - o sonho que Florence teve com sua avó, falecida quando Florence tinha apenas 14 anos, e como isso a abalou e ainda abala, direta ou indiretamente. Passei a ouvi-la de outra forma, com uma visão diferente da letra, e me comovi muito com o que ela nos conta e pela forma como ela se expressa em seu canto. Desde então, toda vez que escuto essa musica, tenho essa imagem da Florence, adolescente, fazendo suas "proprias cerimônias secretas" no jardim do cemitério em um dia muito claro e bonito, assim como ela descreve na letra. Vejo como se fosse uma cena que assisti em algum filme - é bem estranho, pois imagino com certa riqueza de detalhes que não é bem tipica de mim, mas ao mesmo tempo, não deixa de ser interessante.
Então, em cima dessa cena mental que tenho, tudo que ela já contou sobre ela, sua familia e sobre esse evento em sua vida, somei a algumas coisas que eu imaginei da situação e escrevi este texto. Espero que gostem.".
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Sua mente e coração rodavam, assim como ela mesma fazia naquele exato momento.
Suas mãos, já sujas de terra, tocavam a grama rapidamente enquanto girava o corpo em uma estrela completa. O vestido preto descia toda vez, mas não se importava, usava um short por baixo dele - mas de qualquer forma, não havia ninguém ali para vê-la, estavam todos na igreja. Devia estar lá também, esperando que a cerimônia começasse, mas sentiu a necessidade desesperadora de sair de lá nem que fossem por alguns minutos. Precisava respirar, tentar recobrar a ordem em sua cabeça mesmo sabendo que não conseguiria. Já havia chorado em dois dias o que deveria ter chorado pelo menos pelos próximos dez anos, não fosse aquilo. Tudo que restou foi a incompreensão daquilo e incerteza de como seria a sua vida dali para frente – uma vida sem ela.
Continuava a girar e dar estrelas pelo jardim da igreja, uma enorme árvore protegendo-a do sol da manhã, e, mais ao longe, as lápides simples do pequeno cemitério projetavam sombras modestas sobre o gramado.
Ao contrario de como se sentia, aquele dia estava radiante em todos os sentidos, as cores parecendo brilhar muito mais àquela luz matutina – o céu estava mais azul e a grama muito verde e viçosa, como se o mundo inteiro tivesse sido criado momentos antes, embora ele houvesse terminado para ela no momento em que recebeu a noticia.
Chegando da escola com sua irmãzinha, encontrara a mãe querendo falar com elas, séria e com ares de quem havia chorado. Aquilo acontecera há apenas dois dias, mas parecia que havia acontecido há anos. Sua noção de tempo se perdeu em meio à confusão que se projetou dentro dela, da mesma forma como era uma menina de apenas catorze anos, mas que se sentia muito mais velha.
Sentia-se esgotada.
Não fisicamente, pois havia parado de dar estrelas e prosseguia seu ritual pessoal saltando como se pulasse uma amarelinha traçada em sua mente, em ritmos e passos diferentes. Seu esgotamento era acima de tudo emocional, não sabia mais o que sentir - raiva por ela ter escolhido deixá-la assim, tristeza pelos motivos que a levaram a isso, as saudades arrebatadoras que tomaram conta dela desde o momento que sua mãe lhe dera a noticia e até um estranho conformismo e o desejo dela ter conseguido descansar como tanto queria.
Oh minha querida, me conte, porque está assim chateada?
Decidiu fazer uma parada de mão - sempre fora terrível naquilo, mas contou com a parede branca da igrejinha para apoiá-la.
Venha, sente-se aqui comigo e me conte o que está acontecendo.
Parada de cabeça para baixo, sentindo o sangue descer por suas pernas e a pressão aumentar em sua cabeça, fechou os olhos verdes, desejando que a pulsação agora crescente em seus tímpanos abafasse o som da própria tristeza.
Não fique assim, meu bem. Vai dar tudo certo, você vai ver.
Tentava meditar, se acalmar, e, à sua própria maneira, prestar suas homenagens e sentimentos a ela.
As coisas podem parecer difíceis no momento, mas elas sempre se estabelecem e dão certo se você tiver um pouco de otimismo.
Sentia o rosto pálido ficar cada vez mais vermelho, o sangue pressionando-lhe a cabeça.
Tentava com todas as forças se esquecer o que havia acontecido.
Tentava não se lembrar de tudo o que havia acontecido desde que se lembrava dela até antes dela partir.
Venha, meu anjo, vamos até a cozinha, vou lhe fazer um chá. Acho que ainda tenho aqueles chocolates com licor que você tanto gosta.
Sentiu vontade de chorar de novo, mas não conseguiu.
Sentia-se exausta, exausta.
Vai te animar um pouco...
A pulsação em seus ouvidos fez sua imaginação transportá-la para o fundo de um oceano particular, um oceano que ela mesma havia produzido. Não é que não queria aceitar, a verdade é que não conseguia. Não agora. E tinha a sensação que nunca aceitaria.
Vamos. Detesto vê-la assim, tão triste...
Sua cabeça zumbiu e rodou, e não mais agüentando a posição, deixou as pernas tombarem para frente. A forte tontura obrigou-a a tombar o corpo para trás em resposta, estirando-se de barriga para cima. Sentia o calor do dia tentar aquecer seus pés frios, ao mesmo tempo em que a brisa agitava com doçura a franja escura, acariciando sua testa, tentando inutilmente consolá-la.
- Hey.
Abriu os olhos abruptamente, sendo resgatada de se afogar temporariamente sem que esperasse por aquilo.
Era sua irmãzinha, ajoelhada no gramado ao seu lado, que havia se aproximado sem que ela notasse. Usava um vestido simples de veludo negro, fazendo sua pele parecer ainda mais branca e seus olhos azuis parecerem ainda mais cristalinos - embora isso também se devesse ao fato dela estar num humor muito fragilizado, era sempre assim -, uma faixa, também de veludo, prendia os cabelos claros para trás, em alto contraste com eles.
- Você está bem? – perguntou, sua voz infantil soando preocupada. Acariciou com sua mãozinha pequena a testa da irmã deitada na grama. Mesmo tendo doze anos, era mais forte do que ela emocionalmente e estava sendo seu porto-seguro naquele momento tão complicado.
- Sim... – respondeu, com a voz apagada.
- A mamãe pediu para te procurar. Já vai... começar. – sua fala vacilou.
Ela se levantou com certa dificuldade, as pernas ainda meio dormentes, seguiu com sua irmãzinha até a porta da igreja e entraram juntas. Sua família se sentava nos bancos em frente ao altar, onde o caixão escuro repousava aberto.
Sua mente e coração rodaram uma vez mais, a ansiedade e o pânico voltando a se instalar por completo. Não queria ir, não queria vê-la daquele jeito, mas devia isso a sua memória. Ela merecia. Sua irmã, sentindo o seu pânico, passou o braço ao redor de sua cintura como que para ampará-la e motivá-la.
Embora naquele momento quisesse esquecer aquele acontecimento, aquele dia, aquela torrente de sentimentos desagradáveis, ainda voltaria a falar de tudo aquilo, anos mais tarde.
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Only If For a Night - Florence + the Machine - Live at Hackney Empire
Maravilhoso!!! É incrível como isto me dá informações da música -- informações diferentes, ambíguas. É tão estranho ver como tudo parece com a minha vida, totalmente. Florence narrou o que eu senti, vendo agora com este belíssimo texto, o que me aconteceu quando minha avó faleceu, nos meus também 14 anos.
ResponderExcluirEu cada vez mais me apaixono por ela e agradeço pela dedicação de vossa pessoa por postar tão exorbitantes textos.